domingo, 2 de julho de 2017

Histórias extraordinárias

"O que vejo, o que sou e suponho
será apenas um sonho num sonho?"
(Edgar Allan Poe)

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“A verdadeira infelicidade – o supremo infortúnio – é, na verdade, particular. É o sofrimento bem perto. De um só conhecido. Os extremos medonhos da agonia são sofridos pelo homem isoladamente, e nunca pelo homem na multidão.”

“Todos nós sabemos que os indivíduos dotados de boas qualidades mentais são dotados também de um espírito fascinado pela análise. Assim como o homem fisicamente forte se delicia com exercícios que põem seus músculos em ação, o homem bem-dotado de inteligência gosta da atividade mental. Esta lhe traz um prazer imenso. Analisa, soluciona problemas, resolve enigmas. Decifra mistérios. Sabe encontrar prazer nas ocupações mais comuns, desde que ponham em jogo o seu talento.”

“É essencial saber o que se deve observar.”

“Olhar de muito perto prejudica a visão. E a verdade nem sempre está no fundo do poço. Com uma profundidade indevida, perturbamos e debilitamos os nossos pensamentos.”

“...bailando acordes dementes...”

“Mas não tentarei convencer ninguém, nem discutirei a respeito do que creio. Creio. E basta.

“Enquanto isso, minha própria doença tomara rapidamente conta de mim. Não havia remédio para a cura. O mal se agravava, dia a dia. Para lhes dar uma ideia do que era, tento explicar. Não sei se chegarão a entender. Mas começava com um aumento nervoso da intensidade do interesse por determinada coisa. O mesmo objeto ocupava sozinho a minha mente. E eu desenvolvia em torno dele toda espécie de ocupação. Era o meu centro. Uma ideia fixa. Monomania, conforme dizem os médicos. Às vezes, ou quase sempre, uma tolice. Um desenho sobre a margem da página. Ou o texto de um livro. Uma sombra, uma mancha de formato curioso sobre o tapete ou no assoalho... Coisas assim tomavam-me horas, dias, o tempo todo de meditação, de cogitações... A chama de uma lâmpada, as brasas de uma lareira, o perfume de uma flor tomavam-me uma noite ou um dia inteiro. Uma palavra comum ficava na minha mente até que o som deixasse de me transmitir ao espírito qualquer ideia com sentido, tantas eram as repetições. Nesse tempo, eu me mantinha em absoluta imobilidade corporal. Totalmente paralisado.

Quero que entendam que essa anormal, intensa e mórbida atenção, assim despertada por objetos triviais, não deve ser confundida com a tendência à meditação, comum a toda a humanidade. E a que se entregam pessoas de imaginação muito viva. No meu caso, o objeto frívolo tomava o centro de meu interesse sem que das minhas reflexões sobre ele eu chegasse a alguma dedução ou resultado prático, importante ou real. Essas meditações nem eram agradáveis. Eu prestava atenção à coisa. Não estudava. Não especulava, como faz o estudioso ou o simples sonhador. Aquela era a característica principal de minha doença. Minhas investigações, mesmo através das leituras, eram trabalhosas, porém infrutíferas.

Nunca aposte sua cabeça com o diabo.”

“Contanto que seja pessoalmente pura a moral de um autor, nada significa a moral de seus livros. Achamos, porém, que toda obra de ficção deveria ter uma moral. E parece que os críticos já descobriram que toda ficção a tem. Cada livro, um objetivo, uma intenção, uma lição. Uma mensagem. Na verdade, repassando os livros que desafiaram o tempo – aqueles que são sempre atuais -, fica provado que nenhum homem pode sentar-se pra escrever sem um autêntico e profundo objetivo. Um verdadeiro romancista não precisa ter cuidados com a sua moral. Ela está ali. Em alguma parte. No tempo próprio ela aparecerá. Virá à luz tudo o que ele tencionava dizer, tudo o que não tencionava, juntamente com tudo aquilo que ele deveria ter tencionado. E o resto, que ele claramente pretendia tencionar. Assim sendo, tudo dará certo, no fim.”


“As coisas que não consigo explicar sempre me aborrecem.”


“Reguei seu túmulo com minhas lágrimas. Gravei uma barra sinistra em seu brasão de família. Quanto às despesas do funeral, mandei a conta aos transcendentalistas. Recusaram-se a pagá-la. Desse modo, tive de desenterrar imediatamente o Sr. Dammit. E vendi-o para comida de cachorro.”


“O pequeno vagabundo alado...”

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(Edgar Allan Poe - Histórias Extraordinárias)

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